terça-feira, 23 de janeiro de 2018

O principio da solidariedade

por Varderlei Siraque -Professor Doutor em Direito Constitucional

Os fundamentos filosóficos destas linhas podem ser encontrados no trabalho "As competências a serviço da solidariedade", afirma Philippi Perrenoud.

De acordo com Perrenoud "a solidariedade é uma construção social e cultural, uma conquista frágil da civilização" contra o "egocentrismo e o egoísmo". Desta forma, para a construção de uma sociedade solidária são necessárias três condições:



1.O princípio da solidariedade deve fazer parte das ideias e dos valores centrais da maior parte dos indivíduos.Cada um deveria saber não apenas do que se trata, mas acreditar firmemente nele, incorporar a ele uma parte de sua identidade e de sua auto-estima, sentir que, quando se mostra solidário, está de acordo com a cultura do grupo a que pertence, não aparecendo como um ingênuo, e sim como uma pessoa generosa e sensata.

2. Deve existir uma forma de reciprocidade, pelo menos a meio-termo. Apenas um santo poderá dar sem receber nada, certamente porque a alegria de dar dispensa-o de outras satisfações.A maior parte dos seres humanos comuns não pode ser permanentemente solidária em sentido único.É preciso que pelo menos a meio-termo e na média a solidariedade seja um bom cálculo, inscreva-se em um contrato social, em uma forma de reciprocidade.

3.A solidariedade não é sempre dada por antecipação; ela é obtida à custa de lutas individuais e sociais.

Perrenoud explica, também, que a solidariedade depende de uma consciência coletiva por entender que ela é um fato social e,portanto socialmente construída.Este pensamento está em consonância com as ideias de democracia dialógica (baseada no diálogo, na mediação) de Anthony Guiddens.

Em nossa Constituição,nosso Contrato Social, o princípio da solidariedade poderá ser encontrado no artigo 3, que se refere aos objetivos da República brasileira, mas também nos artigos 6 e 170, 225, entre outros.

O importante é compreender que este princípio necessita da mediação jurídica, por isso a positivação desse pensamento na Carta Política foi muito importante, pois deixou de ser uma mera intenção das pessoas e dos governantes de boa vontade para ser uma obrigação do Estado e um direito de cidadania.Pelo princípio da solidariedade a parcela hipossuficiente do povo deixa de ser apenas súditos que recebem favores do Estado e piedade dos incluídos para serem sujeitos de direitos subjetivos públicos e, assim, transformarem-se em cidadãos com dignidade humana, protagonistas de direitos e de obrigações públicas e privadas. As políticas públicas afirmativas ou compensatórias é um ótimo exemplo da aplicação prática do princípio da solidariedade: por exemplo, o Programa Bolsa Família gera um direito ao recebimento de recursos monetários públicos mediante a contrapartida ou a obrigação das famílias beneficiárias matricularem os seus filhos na escola, neste sentido, gera, inclusive, solidariedade intergeracional, pois um dia essas crianças matriculadas na escola poderão ajudar aqueles que delas cuidaram em decorrência da reciprocidade, mas desde que forem educados para a solidariedade, caso contrário, apesar de receberem solidariedade estatal, familiar e de pessoas pias, poderão ser egocentristas e egoístas e a acharem que os resultados para si foram apenas por méritos e esforços próprios, já que a solidariedade não é inata, é socialmente e politicamente construída.


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