terça-feira, 28 de outubro de 2014

A pobreza que une o Brasil

Por Erich Vallim Vicente -Tribuna Piracicabana 

O brasileiro é ensinado que a coroa portuguesa pouco se importou com a Descoberta do Brasil, em 1500. Mas é engraçado que, anos antes da esquadra de Pedro Álvares Cabral aportar-se no litoral nordeste destas terras apinhadas de pau-brasil, o reino dos Orleans e Bragança preocupava-se com “aquelas terras além do Oceano, descobertas e por descobrir”, conforme define o Tratado de Tordesilhas assinado com a Espanha. Talvez, o maior projeto de Portugal no Brasil – além, claro, de salvar a própria pele – tenha sido manter a unidade destas fronteiras continentais.


Mais de 300 anos depois da Descoberta e do malfadado projeto das Capitanias Hereditárias (eficaz na construção de poderes regionais e paralelos), a fuga de D. João VI, em 1808, no desespero para não cair em mãos napoleônicas, trouxe ao Brasil o processo de instauração do estado e, portanto, aprofundamento de raízes para a divisão federativa. Para alguém que vivia no rabicó da Península Ibérica, quando chegou por estas terras deve ter pensado “como isso aqui é grande”. Na ânsia da grandeza lusa, portanto, o Brasil foi construído em terras tão distantes.

Quando declarou o País independente, em 1822, D. Pedro I deve ter sentido frio na espinha em imaginar a unidade desta imensa porção de terra. Eventos separatistas não faltaram. A Independência da Bahia, entre 1822 e 1823, colocou a prova a inteligência e capacidade portuguesas. Ou ainda a Confederação do Equador, movimento revolucionário, de caráter emancipacionista e republicano ocorrido em Pernambuco. Deixar de ser Brasil nestes lugares significaria revés econômico sem precedentes – o Sul talvez nunca tivesse desenvolvido como ocorreria nos séculos seguintes.

Na constituinte para a Carta Magna de 1823, foi urgente recuar diante das pressões regionais contra o fim da escravatura – o que poderia ter acontecido seis décadas antes. Ali, o dilema que segue na vida republicana e federativa brasileira demonstrou ainda mais evidente. Sem exército capaz de enfrentar as oligarquias regionais – luxo que, nos EUA, Abraham Lincoln teve e por isso conseguiu aprovar a 13a Emenda –, o governo abriu mão da modernidade econômica em troca da unidade. O enriquecimento da elite com a escravidão foi, então, conquistada a golpes e chibatadas.

A mesma unidade de fronteiras foi mantida ao longo dos séculos, embora a República também tenha sofrido no campo ideológico e militar para evitar qualquer propulsão separatista no País – e aqui citar Canudos é, não apenas necessário, como também demonstrar a complexidade de um mesmo país nesta imensa extensão territorial. Mesmo assim, não há, entre o Tietê Médio e o Vale do Contestado, ou acima do Jequitinhonha e o Pantanal mato-grossense, nada o que desqualifique o Brasil unificado.

Geograficamente, não existe alguém que leve o outro nas costas, como se diz por aí, na tentativa de desqualificar beneficiários do Programa Bolsa Família. O que há, de fato, é uma imensa terra, onde diferenças culturais e sociais encontram unidade política na tentativa de apaziguar estes abismos. O trunfo do governo reeleito está em apostar no “Brasil, um país de todos” – como dizia o slogan do primeiro governo do ex-presidente Lula.

A presidente Dilma Rousseff entendeu que a totalidade geográfica só faz sentido se as condições sociais forem equiparadas. E pobreza há – convenhamos – e é o retrato vivente das mais sórdidas injustiças sociais, deflagradas do Norte ao Sul, do Leste ao Oeste.








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